Foi jornalista durante 20 anos e em 2004, após uma pesquisa a empresas antigas e a marcas antigas portuguesas começou a fazer investigação. Logo percebeu que havia potencial com “o nosso mercado”. E que tinha uma característica diferente dos outros, havia muitos produtos com as mesmas embalagens antigas. “E que estavam a desaparecer muito rapidamente”. Por estar em voga o design, pensou que podia ser interessante abordar numa perspetiva histórica, e como “nós tínhamos entrado na Comunidade Europeia”.
A grande distribuição começou a desenvolver-se muito rapidamente, não havia tempo a perder.
Não muito distante das letras, trocou o jornalismo onde relatava fatos, para “A Vida Portuguesa” onde conta histórias das suas peças, e faz o seu modo de vida, longe das rotativas. O artesanato português tem muito para nos dar e contar, após a entrada de Portugal na então CEE (Comunidade Económica Europeia) em 1986, os portugueses começaram a ter uma visão mais abrangente sobre a sua posição geográfica na Europa e no Mundo. O que por cá se fazia já era considerado demodé, e as novidades da mundialização deixaram muitos portugueses fascinados com as coisas diferentes que vinham de outros países. O país, e as pessoas, queriam afirmar-se na “modernidade” e avanços tecnológicos, e muitas das artes manuais foram deixadas à sua sorte.
Os portugueses estavam, muito encantados com as marcas estrangeiras, – que eram uma novidade. Achavam que as marcas portuguesas “uma coisa antiga, atrasada”. Não ligavam tanto. A grande distribuição também deixou de fora muitas empresas pequenas ou médias. “E havia ali uma série de empresas em várias áreas que tinha um trabalho muito interessante, nomeadamente a nível da manufatura.” Relembra Catarina.
Há um setor que há 20/30 anos a Europa está a perder, mas em Portugal ainda há muita gente que há uns anos via como um atraso do país. Mas para a ex-jornalista, achava que se devia olhar de forma contrária, ou seja, uma coisa preciosa para o futuro, porque cada vez mais a manufatura é valorizada.
“Comecei a juntar os produtos e a vender caixas com esses artigos e com um livrinho a explicar a história desses produtos, que é muito importante para contextualizar os mesmos.” Explica a ex-jornalista.
Vê-se um produto na prateleira, e muitas vezes não se sabe a sua história até chegar ali. Que a fábrica que o fez tem 100 ou 200 anos. Há produtos de higiene que não foram e continuam a não ser testados em animais, e isso é uma mais valia também para esses produtos, pois é possível fazer um determinado produto de higiene sem sacrificar um ser vivo, sendo muito valorizado e importante. E que hoje em dia até ganhou um novo público. Quando uma fábrica tem 100 anos ou mais, tem sempre muitas histórias interessantes.
Catarina começou a juntar esses produtos, a vender caixas e depois um dia resolveu tentar, pôr isso numa versão loja. “Consegui alugar um espaço antigo no Chiado”. Também queria provar que era possível fazer uma loja, com outro espírito, mas preservando um espaço antigo. Na altura estavam a destruir lojas antigas, por toda a cidade, “que eram lindas”, para substituir por lojas iguais às do shoppings.
“Eu não percebia. Também queria provar que era possível recriar as antigas lojas com personalidade e história, ao contrário das lojas novinhas em folha e sem qualquer historial para contar.”
Fizeram uma loja antiga, organizada por marcas, o espaço todo muito encerado, “muito bonito”, com boa luz a incidir sobre os produtos. Os textos sobre as as marcas, os produtos, e as pessoas de repente voltaram a olhar para esses produtos e voltaram a gostar, e “começámos a vender e a partir daí”, e foram-se passando os anos.
“Chegámos a ter cinco lojas, mas tivemos que fechar duas durante a pandemia e agora voltamos a abrir no Porto”. A nossa primeira loja “perdemo-la este a este ano”. Porque o arrendamento não foi renovado, “mas estamos agora a abrir no Chiado”. Já “abrimos uma parte da loja, vamos abrir a outra na próximo mês”. É uma loja grande que está numa livraria do início do século XIX inteiramente preservada, e encontra-se no coração do Chiado.
Quantas pessoas a trabalhar na “A vida Portuguesa” e quando teve inicio o projeto?
Têm a trabalhar 50 pessoas, mais mulheres do que homens, 70% mulheres e 30% homens. O projeto teve o seu inicio em 2004. “Tinha uma sócia mas depois abandonou a empresa e eu, entretanto reformulei” e passou a chamar-se “A Vida Portuguesa” e abriu uma loja em Maio de 2007.
Isso também fez com que as pessoas ficassem mais conscientes durante a crise. Que era importante comprar produtos portugueses para contribuir para a economia nacional, e para a manutenção dos empregos.
Têm 5000 referências, de 500 fornecedores diferentes em todo o país, desde o Corvo, Açores e várias ilhas, da Madeira, e do Norte ao Sul de Portugal Continental.
Muitas das fábricas históricas estão no norte, porque sempre foi uma zona Industrial e com muitas fábricas e muita produção.
Vendem em Portugal e para o estrangeiro via online. “Vendemos mais para portugueses, porque nós só temos lojas em Lisboa e no Porto e, muita gente portuguesa que recorre à loja online. Temos pedidos de todos os países desde os Estados Unidos, França, Suíça, Japão, etc.”
Têm sido ao longo destes anos todos um verdadeiro show room da produção portuguesa. Hoje em dia “estamos em praticamente todos os guias turísticos em Lisboa. Que recomendam a nossa loja e isso faz com que, por exemplo, também muitos donos de lojas no estrangeiro nos tenham visitado e que gostam de alguns produtos e encomendam às fábricas também esses produtos.”
Projetos futuros
Nos próximos projetos. “Também fazemos produtos exclusivos da nossa marca”. Com várias fábricas “com quem trabalhamos muitas vezes também com os arquivos históricos deles.” Às vezes “fazemos reedições, com a Viarco, nós temos uma série de oito produtos clássicos da Viarco e reeditamos com eles.” Também “vendemos as andorinhas de Bordalo Pinheiro, também são exclusivos nosso em Portugal, agora vamos editar mais”. E para o Natal vão lançar mais quatro produtos, são várias referências, mais uma pequena coleção de produtos exclusivos para a época festiva que se aproxima.
“Temos a abertura no próximo mês desta loja no Chiado que tem 400 metros quadrados, mesmo no Coração do Chiado”. A outra loja era muito mais pequena, tinha menos de 200 metros quadrados, esta vai ser mais do dobro e depois “temos um projeto muito interessante para fazer no início do próximo ano porque vamos fazer uma loja temporária dentro da loja do MOMA do Museu de Arte Moderna, em Nova Iorque.
Mensagem aos nossos governantes
As empresas podem recorrer a apoios em Portugal. “Há uma coisa que eu gostava de ver. E que se calhar devia merecer campanhas nacionais e que têm a ver com o saber fazer das mãos portuguesas e com a manufatura”, muitas destas fábricas neste momento têm falta de pessoas. “Estou-me a lembrar, por exemplo, da Bordalo Pinheiro e da “Viúva Lamego”, que às vezes têm dificuldade em encontrar pessoas que se queiram especializar nestas artes (ancestrais) manuais. Pode dizer-se que muitos países já perderam e que é uma coisa a que nós devíamos dar mais atenção. Fomentando mais este tipo de ensino profissional, porque são artes “que eu penso que têm imenso futuro em Portugal.”
Mensagem ao aos nossos emigrantes
“Considero que os nossos emigrantes são extraordinários no amor que têm aos produtos portugueses, às vezes muito mais do que as pessoas que vivem em Portugal. Dão-lhes mais importância. É extraordinário! E penso que muitas lojas de produtos portugueses, onde há comunidades portuguesas são muito importantes. E são muito importantes também para as fábricas e marcas portuguesas, sem dúvida.” Finaliza Catarina Portas. Mas o trabalho das mãos e os textos a acompanhar continuam nesta história que se auspicia um “final” sempre feliz. A nova história está a começar!