A emigração portuguesa nunca deixa de nos surpreender, as histórias de vida são tão díspares mas ao mesmo tempo com a mesma equação: Em busca de uma vida melhor. Estivemos à fala com António Horta, um alentejano, que nasceu em Beringel, Beja, mas viveu em Matosinhos, Leça da Palmeira, (Porto) e depois foi para o Barreiro, até aos 16 anos. O seu pai foi para a Alemanha em 1972 e em 73 a família foi toda ter com ele. Começou a trabalhar muito jovem, numa fábrica de metal, material para centrais nucleares para refinarias, onde trabalha há 51 anos. E por lá continua, pois, é casado “com a patroa”. Foi convidado para ser Conselheiro das Comunidades Portuguesas (CCP) e aceitou o cargo, mas confessa que “não é fácil”.
Portugal tem os seus melhores embaixadores espalhados pelos quatro cantos do mundo. Quem nunca fez uma viagem o mais remota possível e se deparou com um português? Vamos relatar nesta página a história de mais um português que se “fez à vida” e emigrou.
António Horta é mais um daqueles casos de sucesso na emigração, e faz parte do CCP (Conselho das Comunidades Portuguesas), através de um amigo que também estava no Conselho, Alfredo Stoffel que decidiu não se candidatar mais. António está há muitos anos envolvido no Associativismo na Alemanha, e interessou-se por fazer parte do Conselho. Na cidade havia uma Associação Portuguesa, mas neste momento estão todas em declínio, porque não há aquela necessidade que havia nos anos 70, 80, e 90. As pessoas não dominavam a língua e então juntavam-se nas Associações para falarem, e se ajudarem mutuamente.
“Hoje em dia isso já não existe”. Refere António. As Associações, principalmente aqui na Alemanha, estão a desaparecer. “Eu não posso falar nos outros países, mas aqui estão quase todas condenadas a fecharem”. Os fins de semana são “sacrificados para a Associação” e são as Associações, que comportam trabalhos ingratos, “uma pessoa trabalha, mas há sempre pessoas insatisfeitas”. Desabafa António Horta.
Esteve umas três décadas como Presidente na Associação, em Gelsenkirchen, integrado na Comunidade. A Associação era o Centro Português Unidos, e depois também esteve ligado à política local, no Conselho de Integração e em várias outras juntas.
Há mais ou menos doze anos “formei um partido junto com turcos e com um russo, aqui na cidade”, e tiveram logo no início dois assentos na Assembleia Municipal. “Mas fiquei um bocado desiludido com a política dos turcos”. E “sou casado com uma turca”. Mas não partilhava a mesma ideologia política, e decidiu sair.
O seu amigo, Alfredo Stoffel, decidiu não se candidatar mais ao CCP e António tentou arranjar pessoas para formar uma lista. Gente jovem, apesar de algumas pessoas dessa faixa etária não estarem interessados porque não conhecem o mecanismo do Conselho das Comunidades Portuguesas.
Há uma falta de informação por parte do Estado Português, em informar as Comunidades, sobre o Conselho das Comunidades Portuguesas. “Aqui as pessoas não estão informadas, reparei nisso quando fiz as minhas idas à procura de votos, e notei que as pessoas me perguntavam, o que era o Conselho das Comunidades Portuguesas.”
“Aqui em Estugarda somos quatro Conselheiros, são dois mais a Sul e dois mais a Norte. Na zona Estugarda e na zona consular de Düsseldorf, Hamburgo e Berlim. “Fui eleito juntamente com outro senhor, Manuel Machado.”
As eleições foram em inícios de novembro de 2023. Mas como houve a mudança de governo em Portugal, alguém se queixou e então adiaram a reunião, mas para depois das novas eleições.
“E tudo isso atrasou o processo, tanto que agora só passado um ano é que “nós estaremos, e seremos eleitos, e vamos ao plenário na Assembleia da República Portuguesa. Pois foi lá que estivemos todos representados”, quem ficou com a Presidência foi o Conselheiro Flávio Martins.
O que é que faz concretamente um conselheiro das comunidades portuguesas?
“O próprio nome diz; Aconselha”. E os temas são sempre a mesma coisa: falta de professores; os serviços nos consulados; e o voto eletrónico, é um tema recorrente. “O voto eletrónico, mas não presencial. Não é aquilo que eles querem. O voto eletrónico presencial é a mesma coisa que ir presencialmente às urnas, porque a pessoa tem que se deslocar”. Explica António.
“Não dá para compreender”. “Porque é que os políticos portugueses têm medo do voto eletrónico não presencial?” Hoje em dia “tratamos tudo através destes meios, seja transferências de dinheiro, seja o que for, aqui na Alemanha quando se vai ao médico, já não recebemos a receita, fica registado no cartão e nós vamos à farmácia, entregamos o cartão e está tudo registado, portanto já não existe receitas em papel.”
Uma pessoa que queira votar, tem que fazer uns 200 quilómetros para ir, e mais 200 quilómetros para vir. “Tem que haver uma grande força de vontade, ou talvez eu diria, uma grande amizade, para se deslocarem. Eu experienciei, por exemplo, tantas pessoas que me prometeram que iam votar e depois, quando foi na hora de votar (estive lá durante todo o dia, no Consulado na mesa de voto), reparei que muitas pessoas não se deram ao trabalho, e não apareceram.” “É um problema recorrente”. Refere António.
O meu trabalho como Conselheiro é ouvir os problemas da Comunidade, por exemplo, estive com uma Senhora que vive a uns 100 quilómetros daqui, em Colónia encontrei-a lá porque tive que ir fazer uma entrevista a um senhor para o jornal, e ela estava muito desiludida, só queria fazer uma marcação e não conseguia. “Não compreendo, não compreendo, é que eu já telefonei tantas vezes. Ninguém atende o telefone, para fazer a marcação no consulado”. Desabafa a senhora revoltada com a situação.
A falta de informação, também é um fato, o consulado já não tem atendimento só fazendo marcações, que é feito através de um call center em Portugal.
A aplicação onde faziam as marcações online, era difícil, mudaram isso, “gastaram muito dinheiro para fazer a nova aplicação”, mas mesmo assim é mais difícil do que da outra forma. “Eu no outro dia quis tentar ajudar alguém, que por fim, tive que desistir.”
Se for através do endereço do correio eletrónico do consulado, eles atendem, só que não há aquele número direto como havia antigamente para os consulados, uma pessoa, telefonava para o consulado, atendia a pessoa que lá estava. Mas hoje em dia já não existe isso e essa falta de conhecimento que as pessoas têm que depois leva ao desespero. E chegam à conclusão que não fazem nada.
Estão a poupar em todo o lado e, por exemplo, no consulado de Dusseldorf existia um Assistente Social que foi para a reforma e não meteram mais nenhum. E isso atinge a Comunidade toda. São problemas individuais, mas também têm que ser resolvidos. As pessoas veem-se, aflitas quando não têm ninguém.
Antigamente, nos anos 80/90, havia Assistentes Sociais, mas eram pagos pelas Cáritas. As Cáritas também estão a poupar, a Igreja também tem “pouco” dinheiro. Na Alemanha estão a fechar igrejas. As pessoas não têm essa ajuda. Em Estugarda há um pequeno apoio de um Assistente Social que pertence a uma Associação “onde estou”. Também “sou membro da Associação que é o GRIDPA, é o Grupo de Reflexão e Intervenção da Diáspora Portuguesa na Alemanha, que tenta fazer o mesmo trabalho dos Conselheiros.
Há espaço físico onde se pode receber as pessoas?
Não, não há, ontem “encontrei-me com uma senhora num restaurante. Nós nem temos verbas para nos deslocar a qualquer sítio. É tudo por nossa conta.” Por exemplo, o Secretário de Estado esteve agora aqui a semana passada, creio que em Berlim e “recebi um convite, dois dias antes de ele vir. Vivo talvez a uns, 600 ou 700 quilómetros de Berlim, e eu respondi: Agradeço imenso o convite, além de ser em cima da hora, o Conselheiro não tem verbas para fazer uma deslocação daqui a Berlim e ainda ter que pagar hotel e todas as despesas.”
“Escrevia à senhora lá da Embaixada: Pode transmitir essa mensagem ao senhor Embaixador e ao Senhor Secretário de Estado”. Houve uma reunião online há pouco tempo, “estivemos a falar” e disseram-nos, que “não há verba absolutamente nenhuma”. É esta a realidade que muitos emigrantes vivem lá fora.
Como é que conseguiu ir para a Alemanha e que meios é que tinha na altura para poder sair de Portugal?
Esteve ilegal porque era menor, “a minha mãe fez o requerimento dos passaportes”, mas veio indeferido. “Nós tínhamos um primo no Ministério, que conseguiu o passaporte na segunda via e nós viemos.
Foram a Lisboa apanhar o comboio. Porque antigamente “eu vivia no Barreiro”, e quem vinha do Sul, do Barreiro, não havia ligação para Lisboa com o comboio com há agora, as pessoas tinham que ir todas apanhar o comboio a Santa Apolónia, e depois mudámos em Andaia e daí viemos para Essen. “O meu pai já estava à nossa espera. Mas foi uma aventura. Viemos os três, eu a minha irmã, que também era menor, tinha seis anos, e a minha mãe.”
Quando aqui cheguei era Primavera, não havia neve e as comidas eram diferentes, não estava habituado. Aqui a comida tem muitos molhos. Com maioneses, com Ketchup, e essas coisas. Hoje em dia é conhecido, mas na altura, em Portugal essas coisas não eram existiam.
Não havia mercearias, não havia supermercados, como há hoje, que se consegue encontrar tudo o que seja de Portugal. Antigamente “tínhamos que tentar imitar um bocadinho a cozinha portuguesa com as coisas que havia”. Isso foi uma coisa diferente que “notei”. Ainda hoje eu conto às pessoas que quando falávamos em férias, quando pensava nas férias, a primeira coisa que eu desejava era um bocadinho de queijo ou um pedaço de Chouriço alentejano. Não é porque não tínhamos isso, parece patético, mas é uma coisa que uma pessoa quando não tem mais deseja.”