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Quarta-feira - 22 Janeiro 2025

EXCLUSIVO: João Torres há 42 anos no setor elétrico da EDP

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Com uma carreira de mais de quatro décadas no setor energético elétrico, particularmente na eletricidade, João Torres está na EDP desde jovem, acabado de sair da Universidade. É Engenheiro Eletrotécnico, acabou os estudos e procurou entrar para a melhor empresa no setor e acabou por conseguir. Foi o seu primeiro
emprego e único emprego, teve a “felicidade” de trabalhar na EDP e ter tido uma carreira não só longa, mas também muito variada. Esteve na produção em áreas estratégicas, e de suporte. Esteve na distribuição de eletricidade durante muitos anos e com alguns dossiers na empresa relacionados com temas da eletricidade, da formação, da cooperação para o desenvolvimento de competências que o setor está a precisar, e tem a liderança da Associação Portuguesa de Energia, olhando para os mercados, para os desafios esta é a síntese do percurso onde se encontra neste momento.

Em relação às novas energias e à necessidade de criar novas fontes energéticas como é que EDP se posicionou nos últimos 20 anos?

Em Portugal como, no resto do mundo, o setor elétrico e (fala-se especialmente a eletricidade) foi muito suportado pelo carvão, pelo gás, mesmo mais atrás por combustíveis ainda mais poluentes, como era o fuel oil. No caso português, havia uma especificidade que ainda hoje se mantém que é um país onde a produção Hidroelétrica é muito relevante, tem um contributo ainda hoje decisivo para o mix energético. E foi neste contexto, para além das redes de distribuição e transportes, que a EDP nasceu.

Nos últimos 20 anos surgiu com grande habilidade, porque antes livrou-se de alguns projetos piloto. O tema das renováveis em particular a eólica, por voltada da década de 2000 começou haver esta aposta em Portugal, e como estava também a acontecer no resto da Europa. E nesse sentido Portugal nesses anos tem tido um incremento muito significativo nas energias renováveis. Depois a certa altura também apareceu o contributo da biomassa, que é o aproveitamento de resíduos, e a EDP foi ajustando o seu perfil.

Hoje em dia não tem produção com recurso a carvão, as centrais de gás são de utilização bastante moderada e há uma aposta forte nas energias renováveis e, mais recentemente, dentro das renováveis, a questão do solar assume particular relevância. A EDP corresponde àquilo que aconteceu a boa parte das Utilities no mundo, foi evoluindo no sentido de ter uma maior participação das energias renováveis e tem metas de conseguir em 2035, encerrar definitivamente outros combustíveis para além das renováveis. É uma ambição que é a EDP tem e acompanhado algumas das principais utilities na Europa.

Esta transição descrita muito sinteticamente refere-se à transição energética que acontece por todo o mundo e que as próprias empresas apoiadas no Oil and Gas também estão a evoluir. E hoje em dia, porque mesmo em Portugal, empresas como Galp já têm uma presença na energia solar muito relevante. A Repsol em Espanha ou a BP . Apareceu um novo perfil no setor que são empresas de energia umas com mais peso das renováveis, outras com menos. Mas diria que hoje é mais. difícil distinguir aquilo que no passado acontecia a empresas da eletricidade e empresas do Oil and Gas, hoje apresenta-se ao mercado como empresas de energia.

Há 20 anos atrás, a energia produzida era mais poluente e sabemos que as energias renováveis, a eólica, a solar ou do mar são energias mais limpas, e que conseguem produzir da mesma forma que as poluentes. Porquê tantas reticências em apostar mais cedo e demorar tanto tempo a utilizar energias renováveis, quando todos sabemos que as fósseis têm uma durabilidade limitada. Porquê escolher o caminho das poluentes, e não apostar logo nas sustentáveis? O levou a tomar tanto tempo em apostar nas energias verdes, com pegada carbónica quase 0?

Esta-se a falar de um setor onde esta evolução aconteceu com um forte investimento na inovação. Nesse sentido, e lembro-me há pouco referi isso. Se alguns projetos de energia eólica muito incipientes de pequenas unidades que a EDP sempre fez e outras, e que resultavam com encargo muito significativo, e havendo sempre esta preocupação, de se ter um sistema sustentável e de acesso à energia, é bom ter presente que é preciso garantir que as pessoas tenham acesso à energia e a um custo controlado.

Houve sempre uma preocupação não progredir no mercado esses encargos que conduzia um investimento por megawatt instalado, muito mais, significativo. Nesse sentido, como é que se ultrapassou? Porque é que se conseguiu? Porque a inovação veio trazer soluções às quais o mercado respondeu de forma muito mais positiva a soluções mais económicas. Hoje em dia, um quilowatt instalado de energia eólica é muito mais barato do que era há 20 anos, no solar hoje é muito mais barato que há10 anos. E que a seu tempo se apresentou ao mesmo custo que tinham no passado e bem menos poluente.

A esta realidade chama-se um processo de transformação, pois a transição é um processo de transformação muito significativo. E neste sentido exigem tempo e ponderação e isso levou a que acontecessem agora, nalguns casos, dir-se-á, que foi no tempo certo, alguns países dizem que estamos um pouco mais atrasados, e outros dizem que estamos mais adiantados.

E a questão foi encontrar a solução economicamente satisfatória para definir este caminho, a certa altura deste percurso, foi preciso encontrar incentivos para durante um período apoiarem estas novas energias, novas soluções de energia, o mesmo está a acontecer noutros sectores, por exemplo, na questão dos biocombustíveis, nos combustíveis de baixo enxofre. É um investimento que vai ser feito, vai sendo testado, o próprio hidrogénio, a substituição do gás da troca do hidrogénio nalgumas das indústrias é feito ainda hoje com percentagens bastante baixas de injeção de hidrogénio, mas a pouco e pouco vai-se procurando construir caminhos em que essa substituição possa ser maior e evidente, pois vai permitir desenvolver com efeito escala, toda uma cadeia de hidrogénio, mas a seu tempo, estas transformações acabam por acontecer.

Há aqui uma questão que nem sempre é muito evidenciada das tecnologias disponíveis. Há várias tecnologias que podem dar o contributo para a mesma solução é um ponto que não resulta com facilidade de tempo de ponderação, tem avanços, tem recuos, mas diria que a tendência vai seguindo segura.

Tem estimativas, ou melhor, tem noção quantos anos é que Portugal poderá ter ou poderá ser independente das energias poluentes? O país tem o sol , o mar, e uma costa vastíssima e com muito vento, devido à sua geografia. Portanto, na sua perspetiva, quando é que considera que Portugal pode seguir independente energicamente do resto da Europa, e do mundo, nomeadamente no gás natural. Qual é a sua perspetiva?

Não há uma data segura, para dispensar o gás natural. Não por razões, que não sejam a segurança da rede. Há questões de ordem técnica de ordem eletrotécnica, que tem a ver com a questão de garantirmos que tem uma segurança de abastecimento e que não temos interrupções por motivos de que advenham dessa demora de menor cautela na construção de soluções.

Dito isto, estamos convencidos que olhando para os números, que estão apresentados. Se olharmos para 2040, vamos ter uma função eólica com um contributo relevante. Vamos ter uma produção solar também a crescer com os números. Nesse sentido, uma subida muito significativa, por exemplo, o ritmo a que o PNEC tem expectativa até 2030 que seja dois gigawatts por ano, que é um crescimento muito, ambicioso e a solar Onshore onde haverá reforço de potência dos parques atuais e também a possibilidade de vir a acontecer a utilização de eólico offshore.

Nessa altura, o gás vai ser absolutamente residual e quase como um backup para situações de segurança da rede. Não haverá um dia em que se diz, vamos acabar com isto. Vai ser possível acabar com o carvão em 2040, o gás será residual. A certa altura, também é preciso fazer aqui o balanço. Se essa participação residual do gás nos desafia a fazer investimentos, que na sua relação custo-benefício, mesmo do ponto de vista do impacto ambiental se vale a pena dar esses passos, eu estou convencido que em 2040 estamos a falar do setor francamente diferente daquilo que temos hoje.

O que é que pensa sobre a hidrogénio e sobre a energia Nuclear?

Neste debate que está em curso, não devemos excluir conversar sobre o que quer que seja. Nesse sentido, julgamos que o hidrogénio é uma tecnologia promissora e tem como veículo de transição e de armazenamento em termos de produção de eletricidade, e depois também para os processos industriais, o hidrogénio verde de que falamos é uma solução de futuro. Disso não há grande dúvida.

Há o risco da tecnologia, é preciso que se encontre uma tecnologia. Não podemos ter o hidrogénio disponível no mercado, só porque sim. Tem que ter condições que o mercado reconheça, que tem um custo equilibrado, sob pena de terem funções que depois se repercutem no consumidor. E sabemos que na Associação Portuguesa de Energia temos um temos um o trilema com com três pilares. Um deles é exatamente o da sustentabilidade, temos que ter soluções sustentáveis.

Esse é um tema e depois associado a isso, criar soluções que incentivem o financiamento que é preciso fazer. É conhecido o hidrogénio, sabe-se que há muitas indústrias onde o hidrogénio está presente no seu dia a dia. Estamos a falar de um gás raro. Estamos a falar de um gás muito presente e conhecido. A minha perspetiva é de que vai dar uma solução no futuro. Naturalmente não com a velocidade e o impacto que está marcado na agenda quando apareceu o tema do hidrogénio sobre a mesa, mas claramente vai dar passos seguros e soluções seguras e os projetos que estão a aparecer são projetos muito concretos, e nesse sentido vamos contar com hidrogénio no futuro no desafio do 2040.

O caso do Nuclear, é uma tecnologia que é reconhecido que não tem, faz parte das tecnologias de produção não poluentes ou tem emissões de CO2 quase nulos, mas tem outros desafios. Os próprios modelos, reatores a própria operação é a questão da gestão dos resíduos que não está resolvida.

Olhando para Portugal que tem bastante água e muito sol. Tem também vento com um contributo significativo, é muito difícil encaixar no nosso sistema, uma central Nuclear que funcionaria na base do digrama de carga diariamente. Há uma solução que também está ainda com o outro piloto aqui ali no mundo, que é construção de pequenos módulos os Small Modular Reactors. Os SMR’s de pequena dimensão que são mais adaptáveis a uma rede com a dimensão da rede portuguesa, mas a expectativa de que cheguem é muito mais para lá do horizonte.

A outra tecnologia que é fusão Nuclear essa sim, é promissora muito promissora e seria a solução, mas ainda está muito mais atrasado. Diria, no contexto português podemos falar do Nuclear, mas não me parece que seja estranho que quando se debate o PNEC (Plano Nacional de Energia e Clima) estes documentos de curto e médio prazo que não se refira a energia Nuclear.

Em relação à produção de energia limpa é preciso ter engenheiros, é preciso ter formação e é preciso ter bons profissionais nessa área. Sente que de alguma forma Portugal está preparado para produzir energia limpa e o hidrogénio verde, eventualmente um Nuclear, mas mais seguro, uma fonte de energia mais segurança e limpa. Portugal está adaptada, preparado para enfrentar os novos desafios ao nível europeu e internacional?

Temos seis escolas de Engenharia, quando falamos do Solar e do Nuclear estão a acontecer e são técnicos portugueses que estão a garantir que aconteça, e até gostaria, que aqui jovens que entretanto saíram porque descobriram outras oportunidades fora de Portugal, consigam vir para Portugal, porque estes projetos precisam deles e têm e são desafios muito aliciantes.

O que está previsto em Portugal, no setor, vai exigir muitos recursos qualificados. Estes profissionais foram formados em boas escolas em Portugal, e que tiveram que sair, por uma razão ou outra, certamente encontrarão aqui uma motivação profissional. Porque há outros temas como a questão da fiscalidade, e a própria remuneração, do ponto de vista da motivação profissional, encontram aqui o que encontram em qualquer sítio do mundo. Portugal está bastante avançado. É solar, é eólico é o hidrogénio. São redes inteligentes onde tive alguma intervenção em certa parte da minha carreira e, portanto, diria que esse é um aspeto importante.

Uma carência mais difícil de ultrapassar, é dos técnicos que não sejam das escolas, das Universidades e dos Institutos Universitários. Aí há, uma carência muito significativa e está-se a fazer um esforço muito grande a nível das escolas profissionais. Estou envolvido num projeto da EDP e com outras empresas portuguesas, com o “Green Job Lab”. Procuramos mobilizar e formação das funções muito específicas Nas renováveis e mobilidade elétrica, formar, técnicos.

Quais são as ferramentas que pretendem utilizar para captar o talento que saiu e que está continuar a sair, para captar esse talento aqui em Portugal, o que é que têm feito? O que é que pretendem fazer para atrair esse talento e manter o que está em Portugal? Os salários e a progressão na carreira são algumas das motivações para se expandirem para outras geografias. O que é que vocês pretendem fazer em concreto para “reter” ou para manter esses talentos aqui em Portugal, porque o país precisa deles?

Do ponto de vista dos incentivos, e estamos a falar de salários, o setor em Portugal já paga acima da média. Agora não será suficiente para competir com outros países, mas de alguma maneira está a procurar esse acompanhamento e naturalmente, fica sempre em perda, onde países que têm valores de referência completamente diferentes. Depois há o tema da fiscalidade, onde tanto quanto se percebe, os governos estão a tentar criar soluções que possam olhar e ser vistas com mais atenção e sejam motivadoras.

O que temos que fazer para além da motivação, tem a ver com os incentivos, poder oferecer carreiras em áreas díspares, não apenas na engenharia, há temas como a relação com o próprio direito, a legislação com a questão da economia das pessoas com formação em economia e gestão para aquilo que são projetos de Gestão dos Projetos. Isso compete ao setor mostrarem aquilo que está a fazer e procurar cativar por aí para que os jovens digam: Vou voltar para Portugal. Bem sabemos que não vão compensar completamente o défice do ponto de vista salarial, mas vai trabalhar numa área que gosta, e fazer projetos, que são interessantes do ponto de vista da carreira. Acho que são dois pontos e o segundo ponto obriga a que o setor comunique muito bem aquilo que está a ser feito.

Uma Mensagem que gostaria de deixar aos emigrantes portugueses mais qualificados na sua área? Não menosprezando outras áreas. Mas que Mensagem gostaria de deixar a esses talentos que estão também aprender e a assimilar conhecimento? Qual é a sua Mensagem para os portugueses e o que diria para regressarem e contarem com a empresa EDP no futuro? E o que é que lhes pode esperar em Portugal?

Há uma característica que os portugueses têm nestes confrontos internacionais que vai diminuindo cada vez mais, “mas eu sou de uma geração em que isso era muito evidente.” Havia uma certa uma baixa auto-estima do ponto de vista; “nós não somos tão bons como os outros”.

Eu tive funções internacionais também. Dirigi uma associação Europeia com base em Bruxelas. E comecei a dizer com convicção que isso era mentira. Portanto, a primeira nota e que nós somos tão qualificados como os outros.

Essa é a primeira nota. A partir daí temos que pensar o que podemos fazer em Portugal, vivemos numa era da globalização, onde o acesso à informação é muito facilitado. Com esse acesso à informação, é possível em Portugal fazer caminho e até termos notícias de muitas empresas baseadas em Portugal por portugueses que operam no mercado Internacional. Portanto, de alguma maneira, são emigrantes de forma indireta, porque têm o seu mercado lá fora.

Segundo, é possível em Portugal ter qualquer negócio e equilibrar esses mundos de viver num sítio que gostamos e estamos ligados, e ter uma experiência Internacional. Podemos sempre ter oportunidade de veiculo facilitador, é possível participar via Teams ou zoom numa conferência Internacional em qualquer parte do mundo, e perceber o que é que está a acontecer e conseguir esse equilíbrio entre uma carreira numa área interessante e dar este contributo.

E a área da energia é uma área de grande transformação, de grandes desafios. Nesse sentido, quando se fala em transição energética, estamos a falar exatamente de um período que vai ser demorado de transformação. É bom olhar para Portugal, pensar que aqui também se podem fazer projetos muito interessantes. É bom manter a ligação Internacional. Não legislarmos, usando uma antiga premissa um bocadinho infeliz “no nosso cantinho”, às vezes, sublinha-se muito isso. Julgo que é possível encontrar esse equilíbrio e é o que Portugal precisa. Tem um potencial enorme nas suas pessoas, nas suas escolas. As escolas são habitualmente bem qualificadas no ranking, gostava muito que os nossos jovens se tornassem globais com base em Portugal. Conseguir pôr soluções que depois possam afirmar-se neste mercado, que é de facto muito mais global do que se imagina.

O futuro das energias

Vivemos um tempo de transição energética, um tempo de grande marcado por uma aceleração da chegada das energias renováveis marcado por uma produção descentralizada. Hoje em dia, os próprios combustíveis na nossa mobilidade vão-se para além da mobilidade elétrica. A questão dos biocombustíveis vai ocupando alguma quota de mercado. A questão do hidrogénio quer na distribuição quer nos projetos industriais que temos, também têm caminho. Depois o mercado no balanço entre aquilo que é oferecido e aquilo que é consumido, sendo que o consumo é cada cada vez mais ativo e, portanto, levando à necessidade de soluções muito mais flexíveis na questão na produção e do consumo de energia.

Depois um setor onde a digitalização vai sendo essencial ou aparecendo muitas soluções, é um setor da energia muito desafiante, onde assistimos nos últimos vinte anos ao nascimento de inúmeras empresas com perfis francamente diferentes das empresas mais tradicionais que havia até então. Esta vida muito intensa que o setor energético vai tendo vai marcar os próximos tempos. E onde uma das palavras chave é também a cooperação. Vamos ter que aprender muito uns com os outros e caminhar todos na construção das boas soluções.

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