No menu items!
18 C
Vila Nova de Gaia
Terça-feira - 11 Novembro 2025

Exclusivo: Lema da Plataforma ONGD – “colaborar por um mundo mais justo e solidário”

Destaques

Estivemos em entrevista com Carla Paiva, Presidente da Plataforma Portuguesa das ONGD. Associação privada sem fins lucrativos que engloba 64 ONGD registadas junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Foi criada a 23 de março de 1985, pela mão de Eugénio Anacoreta Correia, então responsável do IDL – Instituto Amaro da Costa, à qual se juntaram outras 12 organizações, “que partilhavam a vontade de atuar na área da Cooperação para o Desenvolvimento, unidas por um objetivo comum que se mantém até hoje: colaborar por um mundo mais justo e solidário.” Sustenta a Presidente.

II Encontro Anual de Associadas, junho 2025

A criação da Plataforma trouxe à sociedade civil portuguesa uma estrutura dedicada à Cooperação para o Desenvolvimento, muito semelhante ao que existia noutros países europeus desde os anos 60, com o intuito de promover o diálogo entre entidades públicas e privadas, fortalecer a solidariedade e a colaboração entre Associadas, e coordenar programas e ações nesta área.

O seu nascimento coincidiu com um momento político crucial – o final das negociações para a adesão de Portugal à CEE -, o que viria a facilitar o relacionamento com as ONGD e Instituições Europeias, bem como o acesso a mecanismos de cofinanciamento. Simultaneamente, as primeiras décadas de atividade foram marcadas por grandes desafios políticos nos países prioritários para as Associadas, como a guerra civil em Moçambique e Angola, a instabilidade na Guiné-Bissau após o primeiro golpe de Estado e a luta pela independência de Timor-Leste.

A aprovação do Estatuto das ONGD, em 1994, e a sua revisão em 1998, marcaram um avanço decisivo no reconhecimento e na consolidação do papel destas organizações na Cooperação para o Desenvolvimento, Ação Humanitária e de Emergência e Educação para o Desenvolvimento em Portugal. Esta legislação veio clarificar a natureza e as áreas de atuação das ONGD, reforçar o seu direito à participação na definição de políticas públicas, e estabelecer mecanismos de apoio como o Mecenato da Cooperação. Ao prever a sua representação em instâncias consultivas, regular o registo e os deveres das direções e reconhecer formalmente as plataformas nacionais, o Estatuto distinguiu as ONGD das restantes organizações da sociedade civil, garantindo maior transparência e acesso a financiamentos, incluindo fundos europeus. A criação, em 2004, do Estatuto dos Agentes de Cooperação veio completar este quadro legal, que continua a ser essencial para assegurar a autonomia, o impacto e o reconhecimento das ONGD num contexto global em constante transformação.

Plataforma ONGD, Assembleia Geral e comemoração interna dos 40 anos, março 2025

Ao representar e apoiar as ONGD portuguesas em contextos nacionais e internacionais, a Plataforma Portuguesa das ONGD procura fortalecer a intervenção da sociedade civil nas áreas da Cooperação para o Desenvolvimento, da Ação Humanitária e de Emergência, e da Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global. Desta forma, reforça as capacidades das ONGD como agentes comprometidos com a solidariedade entre os povos e promove a construção de um mundo mais justo e equitativo.

A sua ação Internacional

O Desenvolvimento Internacional integra três áreas fundamentais – Cooperação para o Desenvolvimento, Ação Humanitária e de Emergência, e Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global – que constituem também os eixos centrais da atuação das ONGD portuguesas e da Plataforma Portuguesa das ONGD. Através destas áreas, promove-se a justiça global e o desenvolvimento sustentável, com base na advocacia política, na capacitação da sociedade civil, na comunicação para o desenvolvimento e no fortalecimento da coesão interna do setor.

Carla Paiva Presidente da Plataforma ONGD

No domínio da advocacia política, “acompanhamos os processos nacionais e internacionais relevantes e procuramos influenciar políticas públicas que contribuam para um mundo mais justo, solidário e sustentável. Produzimos conhecimento e assumimos posicionamentos sobre temas centrais para o setor, com o objetivo de dar visibilidade às prioridades e preocupações das ONGD junto dos decisores políticos. Promovemos ainda uma comunicação ativa e crítica, com o objetivo de aumentar a visibilidade do setor e aprofundar o conhecimento público sobre o desenvolvimento internacional.” Revela a Presidente.

Outro eixo central de intervenção é o da capacitação, com ações adaptadas às necessidades concretas das associadas da Plataforma, e aos desafios emergentes. Através de formações, workshops e programas de aprendizagem entre pares, contribuem para o reforço das competências das ONGD e de outros atores do desenvolvimento.

Em paralelo, fomentam a coesão interna entre as ONGD, dinamizando mecanismos de colaboração e estruturas internas de trabalho e partilha, como os Grupos de Trabalho (Aid Watch, Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global, Ética, e Recursos Humanos e Voluntariado), as Comunidades de Interesse (Administrativa-Financeira e Comunicação), um Grupo de Referência de Ação Humanitária e de Emergência, bem como Task Forces, Grupos Ad hoc ou Comissões sempre que se justifica e que é sinalizado pelas próprias organizações Associadas como uma necessidade. Todos são constituídos no seio da Plataforma, e incentivam a partilha de experiências e fortalecem a sustentabilidade organizacional do setor.

No que respeita ao setor das ONGD em geral, a Plataforma realiza ainda atividades de caráter bienal que promovem oportunidades de sinergia e interconhecimento, assim como de reflexão sobre temas relevantes. A Academia do Desenvolvimento é uma atividade que privilegia a partilha de conhecimento através de uma abordagem de capacitação entre pares, procurando envolver o setor público e privado lucrativo, assim como as universidades. Por outro lado, o International Development Summer Course, realizado em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian e o CEsA/ISEG, conta com o contributo de reconhecidos pensadores e profissionais do desenvolvimento, nacionais e internacionais. O objetivo é dar a conhecer as tendências e desafios do Desenvolvimento Internacional, capacitando os atores para a transformação, de forma a que estes façam parte da construção e desconstrução das políticas, estratégias, processos e ações futuras a nível nacional e internacional.

II Encontro Anual de Associadas, junho 2025

Tem desenvolvido um trabalho estreito de colaboração com outras Plataformas de ONG, designadamente dos PALOP, Brasil e Timor-Leste, tendo criado em 2019 uma rede informal de Plataformas Lusófonas de ONG que ainda hoje prossegue o seu propósito. Esta rede pretende contribuir para a melhoria das políticas públicas na área da Cooperação para o Desenvolvimento, assim como para o reforço do espaço cívico, “num momento em que a instrumentalização da Cooperação é cada vez mais a notória e os ataques às organizações da sociedade civil se multiplicam por todo o mundo. Esta rede foi criada porque se considerou essencial aprofundar a partilha de conhecimento entre as Plataformas e intensificar a capacitação e o estabelecimento de parcerias para advocacy, com base em áreas de atuação e objetivos comuns.” Menciona Carla Paiva.

A nível nacional, a Plataforma coopera também com outras redes de ONG de outras áreas setoriais, como a Juventude, os Direitos das Mulheres, o Desenvolvimento Local e Rural, e o Voluntariado. Esta colaboração decorre no seio do Fórum da Sociedade Civil para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), uma rede também de caráter informal que funciona desde 2014 e que pretende desenvolver uma intervenção de longa duração, coincidente com a vigência da Agenda 2030, funcionando e intervindo de forma flexível e potenciadora do conhecimento, expertise e interesse dos membros que o compõem. Os membros do Fórum têm promovido um diálogo intersetorial, “inclusivo e participativo que procura contribuir para encontrar respostas para os desafios globais e locais que enfrentamos”. Refere a Presidente.

Dada a importância do papel da Sociedade Civil na implementação da Agenda 2030, pelo seu conhecimento e proximidade ao terreno, pela sua visão apoiada na defesa dos direitos humanos e do bem-estar das populações, e pelo seu trabalho de influência política e promoção da consciencialização da opinião pública, tona-se ainda mais premente que as organizações se juntem para trabalhar de forma mais articulada e consequente.

O maior desafio

Os desafios que a Plataforma enfrenta não se podem dissociar das crises que assolam o mundo. “Verificamos com elevada preocupação o aumento das violações de direitos humanos e o atropelo aos valores democráticos, com uma sociedade civil defensora dos direitos fundamentais, das minorias ou do ambiente sob crescente pressão legal, política e financeira. Num cenário mundial marcado pela ascensão do populismo e do autoritarismo, enfrentamos o desafio de responder a ações que distorcem o debate político, através da desinformação, da mentira e do discurso de ódio que dominam a comunicação pública.” Salienta.

Este é um desafio exigente, que “nos convoca a encontrar formas cada vez mais eficazes de comunicar e sensibilizar a sociedade para a importância do trabalho desenvolvido e dos resultados alcançados nas áreas ligadas à cooperação para o desenvolvimento. Fazemo-lo num contexto em que o sistema internacional, apesar de continuar formalmente baseado em regras e no direito internacional, vê essas mesmas regras frequentemente ignoradas ou desrespeitadas por muitos atores. O seu uso instrumental ao serviço de interesses nacionais, com decisões unilaterais, enfraquece o multilateralismo, a cooperação internacional e a diplomacia.” Sustenta Carla Paiva.

Como organizações da sociedade civil, que contribuem para os equilíbrios de poder e para o escrutínio público, vive-se com preocupação a crise da democracia e os ataques aos direitos civis fundamentais, bem como aos princípios e valores que são tão caros às organizações. A Plataforma deve estar ao lado das organizações neste período desafiante, contribuindo para reforçar a sua capacidade de resposta a este contexto ameaçador, fortalecendo a sua resiliência e defendendo condições políticas e financeiras adequadas para que as ONGD possam continuar a intervir.

Trabalham no terreno ou fazem monitorização das outras ONG?

A Plataforma colabora com outras plataformas e redes de países parceiros da Cooperação Portuguesa, mas não intervém diretamente no terreno. Essa colaboração centra-se em ações de advocacy coordenadas junto de decisores políticos nacionais e internacionais, procurando sensibilizar para os desafios enfrentados pelas organizações locais, nomeadamente no que respeita às restrições ao espaço cívico. De forma coordenada e em parceria, procuram mobilizar apoio político e da sociedade para melhorar o contexto em que essas organizações operam a nível nacional, promovendo ações conjuntas de influência política e de comunicação externa, que apoiem as suas propostas e deem visibilidade às suas preocupações.

Enquanto rede colaborativa, a Plataforma não tem como missão monitorizar as práticas das organizações, mas sim apoiá-las no reforço das suas capacidades e na criação de um enquadramento político, legal, financeiro e social mais favorável à sua atuação. Através da implementação de um Código de Conduta interno, promove a melhoria das práticas e da conduta das organizações, com impacto na forma como desenvolvem as suas atividades e projetos de cooperação para o desenvolvimento e ação humanitária nos países parceiros.

A Plataforma representa 64 ONGD, apoiando-as através de um trabalho contínuo de articulação, representação e capacitação. O apoio que presta assume formas diversas, ajustadas às necessidades e prioridades das associadas, indo desde a promoção de ações de formação e capacitação específicas, ao apoio na interpretação de enquadramentos legais ou na criação de oportunidades de cooperação.

Facilita ainda o acesso a informação relevante, atualizada e útil para a intervenção das ONGD, seja sobre políticas públicas, oportunidades de financiamento, ou tendências internacionais. Atua também como ponte entre as ONGD e decisores políticos, instituições públicas e outras redes da sociedade civil, procurando garantir que as preocupações do setor são ouvidas e tidas em conta.

Este trabalho contribui para o coletivo do setor e para uma presença mais articulada e influente das ONGD no debate público sobre o desenvolvimento internacional.

Planos para o futuro

A Presidente adiantou-nos que quarenta anos depois da sua criação, e num mundo marcado por novos desafios políticos e sociais à escala global, a Plataforma continua a afirmar-se como um espaço de encontro, cooperação e compromisso com um futuro mais justo, solidário e sustentável para todas e todos.

Os próximos anos serão dedicados ao reforço do apoio em termos de advocacy às ONGD e, em particular, aos setores da Cooperação para o Desenvolvimento, da Ação Humanitária e de Emergência, e da Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global – áreas centrais para a justiça global e para a construção de respostas solidárias aos desafios do presente.

“Pretendemos encontrar formas mais adequadas e eficazes de responder às necessidades das nossas associadas, sobretudo num contexto em que se torna mais difícil comunicar e sensibilizar a sociedade portuguesa para a importância do trabalho das ONGD, apesar do apoio que estas continuam a merecer por parte da opinião pública.

Olhando para o futuro, acompanharemos de forma ativa a implementação da Estratégia da Cooperação Portuguesa 2030, a aprovação e operacionalização da nova Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento (ENED), e iniciaremos o trabalho de preparação do cenário pós-Agenda 2030, em especial no quadro da política europeia de desenvolvimento.” Finaliza Carla Paiva.

Ver Também

DESTAQUE: WebSummit Lisboa dá o pontapé de arranque

Começa hoje, 10 de novembro, mais uma edição do Websummit Lisboa 2025, espera-se casa cheia, as baias já estão...