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Quarta-feira - 22 Janeiro 2025

EXCLUSIVO: Nuno Crisóstomo, uma vida ao serviço da UNICEF

Destaques

Kinshasa nas Margens do Rio Congo

A vida de um funcionário das Nações Unidas também implica, para além do conhecimento teórico e prático, uma resiliência forte, e sentido de adaptação, particularmente quando se vai em missão. Nuno Crisóstomo, iniciou os seus estudos Universitários em Portugal no final dos anos 80, início dos anos 90. Começou primeiro na vertente educativa pelo técnico profissional e depois passou para o ensino Superior. Começou a vida profissional em Portugal no final dos anos 80, “e depois dei continuidade na África subsariana a partir de 1993”. Há cerca de 31 anos que deixou Portugal, e um trabalho enorme e cheio de histórias para contar.

Quando se estabeleceu em Moçambique, em 1993 prosseguiu os estudos universitários na África do Sul. E em 1996, quando foi viver para Nova Iorque continuou a sua formação universitária nos Estados Unidos completando o mestrado em 2001, data em que passou para a UNICEF. Quando foi para as Nações Unidas já tinha completado o Mestrado.

República Centro Africana

Trabalhou 20 anos na UNICEF, inicialmente com variadíssimos tipos de contratos. “Comecei como consultor, por vezes o contrato de três meses, por vezes um mês, dependia da disponibilidade dos fundos. Foi uma altura difícil para o mundo, porque foi no mês de Setembro de 2001.”

Estava em Nova Iorque, quando se deu o 11 de Setembro, a ansiedade das pessoas ainda se fazia notar, e algumas incertezas a pairar no ar, mas a vida continua e as coisas foram evoluindo, e os contratos foram sendo renovados.

As condições contratuais foram melhorando e acabou por passar a contrato vitalício, por volta de 2011, 2012, com retroativos, a contar do início de 2002.

No Norte da República Democrática do Congo.

Em 2019 a minha esposa, por razões pessoais, e familiares resolve reformar-se. “Eu já tinha direito a pedir a reforma também em finais de 2019, mas resolvi esperar. Para ver como é que a minha esposa se orientava, na vida dela, pessoal e familiar, de maneira que esperei um ano. Entretanto, dá-se a pandemia, e no final de 2020, como já tinha direito à reforma, pedi-a e saí.”

Trabalhou nas Nações Unidas 20 anos e para o Governo português, entre 1988 e 1996. Esteve em Moçambique nos processos políticos, de resolução de conflitos muito difíceis, esteve na altura a acompanhar todo o processo de paz em Moçambique, que durou cerca de três anos.

Esteve em missões de curta duração na Guiné-Bissau, em Cabo Verde, em São Tomé. Trabalhou 8 anos para o governo português e fez 52 deslocamentos. Havia missões muito curtas, do género ir e voltar no mesmo dia. E a última esteve três anos em missão em Moçambique. “Devo ter à volta de 35, 36 anos de trabalho, que é considerada como carreira de longa duração.”

“A minha primeira missão em Moçambique foi em 1990. Ainda durante a guerra civil. Foi logo no início das negociações de paz de Roma, que começaram, se não estou em erro, no Verão de 1990. E que deram origem ao Acordo Geral de Paz de Outubro de 1992.” Chegou a Moçambique em 1990 foi exatamente numa dessas missões de curta duração, porque não havia condições.

Chegou-se à conclusão que não havia condições e não era oportuno naquele momento, devido ao processo de paz que se está a passar, as negociações para a paz estariam a decorrer em Roma, foi decidido a nível superior, de congelar os projetos. Daí ter esperado até 1993. Em relação a Moçambique, o acordo geral de paz já assinado, e fazer implementação a partir de 1993/94 no início, em termos de resolução de conflito e a desmobilização das duas forças antagonistas, a chamada RENAMO (resistência nacional moçambicana) e o Governo de Moçambique. Quando o Governo toma posse no início de 1995, voltou-se aos acordos gerais de cooperação de Estado a Estado. Já não havia limitações, uma vez que o conflito tinha terminado.

Resolução de conflitos “acordo geral de Paz de Roma”

O acordo geral de paz de Roma tinha três países mediadores: os Estados Unidos, a França e o Reino Unido, e depois foram convidados outros Estados-Membros das Nações Unidas convidados a enviar a contribuir com forças e com fundos.

De maneira que “eu fiquei integrado numa missão político-militar que o Governo português estabeleceu para a implementação do acordo. Para além dos três países mediadores, depois foram convidados, Portugal, Itália também foi convidada. Penso que na altura também a Federação Russa.”

Todos Estados-Membros das Nações Unidas – “durante esse período ainda não tinha contrato com as Nações Unidas”. “Não fazia parte das forças de manutenção de paz nem nenhuma agência, Portugal tinha participação através das agências das Nações Unidas e da missão de paz, mas eu eu estava completamente numa missão política-militar portuguesa, de apoio ao processo de paz.”

Na prática, o Acordo Geral de Paz Moçambique é assinado em Outubro de 1992. E nesse ano em Outubro de 1992 deu-se o colapso do acordo de paz de Bicesse, para Angola de 1989, e o re-início do conflito armado em Angola.

As partes envolvidas nas eleições gerais de 1992 não aceitaram os resultados e voltou-se ao conflito armado. No final de 1992. Toda a gente ficou com receio, que em Moçambique iria passar-se a mesma coisa. Houve uma enorme preocupação mundial. Aprendendo com as lições de Angola, com o falhanço do Acordo de paz de Bicesse, que foi assinado aqui na Escola de Hotelaria de Bicesse, aqui junto ao Estoril em 1989.

Tentou-se aprender com as lições do passado, do Acordo de Paz de Angola, de Bicesse, e tentou-se que em Moçambique não acontece a mesma coisa, “mas o processo foi bem sucedido, foi para mim, pessoalmente e profissionalmente, um dos um dos grandes sucessos da minha vida pessoal e profissional.”

O acordo geral de paz de Moçambique de 1992 ia pelo mesmo caminho de Angola, não havia garantias nenhumas que as partes iam aceitar os resultados das eleições. Foram anos muito difíceis, em especial 1993/94 até o início de 1995, foram anos muito complicados, porque, o conflito em Angola continuava.

A última tentativa de re-estabelecer a paz em Angola foi o Protocolo de Abidjan, de 1994, negociado na maior cidade da Costa do Marfim, de maneira que “eu acho que para além do muito trabalho e da qualidade profissional das pessoas envolvidas, foi também o facto do Presidente Nelson Mandela ter ganhado as eleições presidenciais, as primeiras eleições presidenciais livres na África do Sul em 1994.”

Transformou muito as mentalidades de um lado e do outro. Mas não foram fáceis. Para Moçambique, infelizmente, o conflito tem reacendido. Aqui e agora, ainda neste momento mais a no Norte com os chamados islamistas, que era uma componente que não existia no início dos anos 1990. A componente religiosa no conflito em Moçambique praticamente não existia.

Nessa essa altura já havia comunidades de confissões diferentes diferentes. Entre o Norte e o Sul de Moçambique , mas nem pouco mais ou menos com a conflitualidade que existe neste momento, em especial desde 2017 para cá. Portanto, isso é um dado novo.

A entrada para a UNICEF em Nova Iorque

Em Nova Iorque foi trabalhar para a UNICEF ( Fundo das Nações Unidas para a Infância), num setor muito específico, no departamento de resposta de emergência a nível mundial. Cobre o mundo inteiro das Nações Unidas e neste caso na UNICEF. Que está presente em mais de 193 países e territórios, e tinha responsabilidades geralmente regionais. “A UNICEF está dividida em sete regiões e eu trabalhei essencialmente para a América Latina e as Caraíbas e a África ao Sul do Sahara e um pouco para o Médio Oriente, porque o Médio Oriente acaba por ser um pouco recorrente. Com as crises no Médio Oriente.”

A resposta às situações de emergência de coordenação de resposta de emergência da UNICEF não só em termos de conflitos, “que era a minha especialidade de Mestrado”, Resolução de Conflitos Internacionais, “mas também cerca de 50% do meu tempo era dedicado à resposta aos desastres naturais. Portanto, sismos, furacões tufões, pandemias tudo o que afeta, a vida de uma criança, desde o pré-natal, desde o zero até aos 18 anos.”

Os seus últimos três anos ainda de baixo do guarda-chuva da UNICEF. Os últimos três anos foram em Kinshasa, na República Democrática do Congo. Também coincidiu com toda a transição política no Congo, com as eleições de 2016. Que acabaram por ser somente em 2018 e com o Presidente eleito em 2019. “No Congo eu tinha, responsabilidades a nível nacional. Continuava debaixo do guarda-chuva da UNICEF. Mas era coordenador nacional dedicado aos deslocados que no Congo, que são à volta de 5 milhões ,” essencialmente devido às populações deslocadas, devido ao conflito no Leste do Congo, “eu era coordenador nacional em termos de abrigo, casas para essas populações deslocadas, e o recheio de que as pessoas precisam de ter nas suas casas para viverem.”

Tinha uma equipa de 42 organizações nacionais e internacionais que se dedicavam a fazer este trabalho com orçamento anual de 150 milhões de dólares.

As suas responsabilidades eram só dentro do Congo, que, é um dos maiores países de África. “Mas tudo o que se passava fora das fronteiras do Congo já não era comigo, eu era o coordenador nacional, para esta para esta área em particular.”

Dentro das Nações Unidas, a resposta às emergências a nível nacional são coordenadas por clusters. Era o coordenador nacional de um dos clusters, “digamos assim, eu respondia diretamente ao Primeiro-Ministro do Congo.”

A chegada da reforma

“Reformei-me em plena pandemia, fui viver para França,” onde ainda passa a maior parte do ano neste momento, por razões familiares e de saúde, da sogra e durante o segundo confinamento a NYU onde tinha estudado, “na New York University, a reitora da minha antiga faculdade pediu-me para eu me candidatar ao lugar de “Brand Ambassador da NYU”.

Candidatou-se foi aceite, e neste momento “é uma das minhas ocupações formais; representar os antigos alunos na NYU, que está espalhada pelo mundo. O campus principal, continua a ser em Manhattan, na Cidade de Nova Iorque, mas têm desde 2010, um grande campus no Abu Dhabi, um dos sete Emirados Arabes Unidos na região do Golfo, devido às dificuldades em obter vistos para os estudantes, em especial de nacionalidades oriundas do Sul global para conseguirem estudar em Nova Iorque. Desta forma a NYU está a direcionar essas pessoas para o Abu Dhabi, um campus que tem à volta de 400 alunos já está a ministrar desde 2010, licenciaturas, mestrados e doutoramentos.

“As minhas funções são representar os antigos alunos e mobilizar os antigos alunos, focando mais na África Subsariana, que é onde eu conheço melhor e a Europa.” Ao mesmo tempo recrutar alunos. “De vez em quando vou em missão aos grandes países de África, como, por exemplo, à Nigéria, às escolas secundárias e liceus de excelência, divulgar os graus de ensino que a NYU ministra, recrutar novos estudantes, em colaboração com os núcleos de antigos estudantes que existem nestes países.

“Estou nos Estados Unidos quatro meses por ano, o resto estou em França, ou estou em Portugal. Quando vou aos Estados Unidos, fico normalmente um mês, por vezes dois meses.”

Também se dedica a colecionar arte contemporânea Africana, em especial do Congo e de Moçambique, “tenho um grupo de artistas, que eu faça promoção, divulgação, empréstimos da minha coleção familiar, que iniciei com a minha esposa há cerca de 30 anos, de maneira que também giro esse património artístico.”

“Também vou estar a trabalhar nos Jogos Olímpicos em Paris, e Paralímpicos, de maneira que tenho estes pequenos projetos também.”, finaliza Nuno Crisóstomo.

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