Filipe Silva, é licenciado em Humanidades, e professor de português. Sempre teve o sonho de um dia ir trabalhar para fora do país. Não foi tarefa fácil, e teve de passar algumas provações. Da sua primeira investida, para Cabo Verde, foi um sonho deitado ao esquecimento. Estaria Díli a fazer-lhe uma vénia? Já lá se encontra há 25 anos, como professor e Assessor. Colegas seus tinham conseguido almejar uma vida profissional no estrangeiro, mais concretamente nha terra de Cabo Verde, e lhe contavam as suas experiências pessoais e profissionais muito enriquecedoras. Recomendaram-lhe Timor-Leste, do outro lado de lá do planeta. E por lá continua.

Foi no timing certo, estava à porta o referendo, e o país ia começar a usar a língua oficial portuguesa, necessitando de mais professores, e foi em 2000 que deu o salto do Ipiranga.
Passados dois, três meses de se encontrar a trabalhar em Díli, foi trabalhar com a pessoa que estava a coordenar os professores, de seu nome, Maria José Carrilho, que o desafiou para outra tarefa: a distribuição de todos os livros que o Governo Português oferecera a Timor na altura, para a primeira e segunda classes, em todo o país, onde fez essa coordenação.

Foi a partir desse momento que passou a trabalhar nessa área, e como professor desempenhou-a durante algum tempo, mas mais tarde começou a trabalhar a tempo inteiro na coordenação, em dar apoio, onde se manteve até 2006, altura em que passou a ser o coordenador dos professores portugueses em Timor-Leste até 2011.
Daí para a frente, o seu percurso profissional tem sido, em colaboração direta com as autoridades timorenses, quer no Ministério da Educação, quer agora no Ministério do Ensino Superior Ciência e Cultura, desde outubro de 2010. Deixou de trabalhar diretamente para a cooperação portuguesa, centrando mais a sua atividade para as autoridades timorenses, onde trabalhou no Ministério da Educação, sendo que neste momento está no Ministério do Ensino Superior, Ciência e Cultura, na qualidade de Assessor para a área da política, planeamento e orçamento.

Projetos em Timor-Leste
Timor-Leste, pediu apoio a Portugal para a promoção da língua portuguesa. Este prontificou-se em ajudar, deslocou numa primeira fase, cerca de 160 professores para Timor, grupo do qual Filipe Silva fez parte, e centrava-se acima de tudo, no ensino da língua portuguesa, aos professores timorenses e alguns estudantes. Todos os que podiam abarcar, porque “não tínhamos números suficiente de pessoas para albergar toda a gente ao mesmo tempo. Também demos aulas a funcionários públicos e outros profissionais, sempre que possível.” Salienta o professor.
As condições das escolas em Timor quando lá chegou, eram más. Não tinham mesas, cadeiras, e luz. Não tinham nada, “eu dava aulas com os estudantes sentados no chão, e o maior desafio é que eles também não falavam português e, ensinar uma língua estrangeira, sem qualquer condição era um desafio ainda maior, mas ao mesmo tempo também era gratificante quando se conseguia que começassem a aprender algumas palavras em português e a comunicar em português.” Refere.

Quando lá chegaram, a maioria eram estudantes e alguns professores. A partir de 2002, o foco da cooperação portuguesa mudou para dar prioridade aos professores e menos aos estudantes. Ou seja, a ideia era que fosse uma formação em escala, em que abarcasse mais professores, e que esses professores ajudassem depois no ensino da língua portuguesa.
Estado atual da língua portuguesa em Timor-Leste
“A língua portuguesa em Timor-Leste, neste momento ainda é um desafio. Melhorou, como é óbvio”. Salienta Filipe Silva. Os últimos censos indicam que cerca de 30% da população fala escreve, e compreende português, mas uma vez que o português é uma língua que não é usada no dia a dia, e não é materna, os alunos em casa não falam português, o que implica vários desafios.
É essencial e precisa de ser continuado e haver maior investimento, não só da parte de Timor, mas também dos próprios países da CPLP, no sentido de apoiar Timor a difundir a questão do português.
Como professor, as maiores dificuldades neste momento em Timor-Leste, sentem-se em várias áreas, “temos que distinguir os professores portugueses e os professores timorenses. Os professores timorenses neste momento ainda apresentam muitas dificuldades ao nível dos próprios recursos materiais da escola, apesar de estarem muito melhores do que estavam há 25 anos atrás. Ainda há muitos desafios. Há escolas que não têm eletricidade, outras não têm cadeiras suficientes para todos os alunos. Não há projetores, e ainda há muitas dificuldades materiais que influenciam a parte do ensino.
A preparação dos professores timorenses ainda é bastante limitado. Há bons professores, com boa formação, mas ainda é um número muito reduzido e que carece de maior investimento e de uma nova geração de professores.
No que diz respeito ao nível dos professores portugueses, “eu acho que a questão do desafio continua a ser a questão do português não ser massificado, ou seja, não ser usado no dia a dia. Dão-se cursos de português durante sete, oito meses, as pessoas que participam nos cursos aprendem português, mas depois se tiverem dois ou três anos sem ter contacto, volta-se a perder algumas das competências. “Isso é um desafio da continuidade, de ser usado no dia a dia.” Desabafa Filipe Silva.
Falar de Internet é falar dum “bicho Papão”?
Para Filipe Silva, diz que sim, “nós tivemos uma boa notícia recentemente, foi finalmente concretizado há dois ou três meses, o acesso à Star Link em Timor. É uma Internet um pouco mais rápida, pois a Internet que é fornecida pelas empresas de telecomunicação é muito fraquinha, pondo o caso da Internet como um desafio. Não existe ainda um cabo submarino que ligue Timor a outros países, estão em processo de o fazer, mas ainda não está completo.
A grande maioria dos professores encontram-se em Díli, na capital, são entre 60 a 70 professores portugueses. No resto do país, nos 12 municípios da Região Autónoma Administrativa, estarão cerca de 130, 140, não se sabe em concreto, “mas hão-de ser esse número. Que abrange o projeto CAFE, que são os Centros de Aprendizagem e de Formação Educativa.” São escolas Timorenses que usam o currículo Timorense, mas que têm na sua maioria portugueses nessas escolas. É uma escola por cada município. Uma espécie de escola de referência em cada município, à semelhança da escola portuguesa de Díli. A escola portuguesa de Díli usa o currículo das escolas portuguesas em Portugal, e as outras escolas usam o currículo timorense, só que é ministrado totalmente na língua de Camões.
Sentem-se privilegiados em relação aos professores que estão em Portugal?
“Não me sinto nem prejudicado, nem privilegiado, a situação é a mesma, sendo que a escola portuguesa, em Díli, os professores que estão nessa escola portuguesa, neste momento, viram finalmente resolvido um problema antigo. Os professores contratados que estavam lá não tinham metade dos benefícios dos professores que estavam em Portugal no quadro, e que iam em mobilidade para Timor, e neste momento essa situação foi resolvida. Felizmente já começa a haver o quadro de escola portuguesa de Díli, que é um aspeto muito positivo.” Concluiu.
