Catarina Ferreira Marques terminou a sua licenciatura em Direito em 2016. Trabalhou um ano no SEF, no período da transição para a AIMA, entre 2022/2023, antes de se inscrever nos exames de agregação à ordem dos Advogados. Atualmente é sócia da Sociedade de Advogados Ferreira Marques e Associados. A sua “paixão” no Direito prende-se com o fator humanitário, onde encontrou o respaldo jurídico/legal para ajudar os estrangeiros no processo de legalização em Portugal.
Afastou-se da atual AIMA, porque gostava de trabalhar do outro lado da “barricada”. Já na situação de advogada, e com a prova de agregação feita, continua a trabalhar com estrangeiros no processo de legalização.
É um processo “muito desafiante”, à presente data os advogados vêm-se obrigados a intentar uma ação em tribunal, “porque não há marcações para nada” e “estamos sempre a aguardar as decisões do Tribunal para proceder à legalização dos estrangeiros”, declara a advogada.
No que diz respeito à legalização e à maior dificuldade que os estrageiros enfrentam, é a malha da burocracia portuguesa.
Neste momento, desde que revogaram o artigo 88/6 da Lei dos Estrangeiros, deparam-se com grandes desafios, porque se não tiverem um visto para trabalho não conseguem legalizar-se, a não ser que preencham algumas particularidades, como por exemplo, serem filhos de portugueses ou casados com um cidadão comunitário, entre outros casos pontuais previstos na Lei.
Mas mesmo assim não conseguem legalizar-se, como acontecia anteriormente, ou seja, antes vinham para Portugal, fosse com que visto fosse, e ao fim de um ano, com os descontos, tinham sempre o direito ao Título de Residência para trabalho, que é a generalidade dos Títulos para o estrangeiro comum, que procura melhores condições de vida em Portugal.
Mas a realidade de hoje é outra. Neste momento, aquilo que “nós sentimos” é que antes era mais fácil obter as marcações, hoje, há um ano e meio que não há, para estes “imigrantes” soluções imediatas para poderem tratar da sua legalização.
Gastam muito mais dinheiro, porque “nós temos de intentar ações judiciais”, para que a AIMA, proceda à marcação ou se pronuncie. “Como advogada penso que é, sem dúvida, o maior desafio que enfrentam”.
Mas há mais constrangimentos, logo à partida não existe um espaço físico onde se possam dirigir. “Há uma plataforma na AIMA por causa dos reagrupamentos familiares, que acabam por simplificar o procedimento do mesmo, à semelhança daquilo que acontecia com o artigo 88 para o trabalho. “A manifestação de interesse”, pode-se proceder eletronicamente. Depois que se paga a taxa para a emissão do cartão – mas a realidade é que depois fica tudo parado. Não há ninguém do outro lado a despachá-los, a única maneira que têm hoje em dia, é sempre a mesma: “ação judicial para intimação para dar resposta a um processo que já foi instruído pela Internet.”
Os estudantes da CPLP
Segundo a advogada, Catarina Ferreira Marques, pensa que não tem havido grandes dificuldades para a concessão do visto de estudo.
No entanto, depois sentem dificuldades em tratar do título de residência.
A não ser que o façam através da CPLP. Só que a CPLP, torna-se num problema a curto prazo, porque tem a validade de um ano. Não dão condições que o Título de Residência dá, não se podem ausentar para outros países da Europa, (apenas lhes dá a permissão para poderem deslocar-se de Portugal até ao seu país de origem e regressar) e cujo documento não é reconhecido a nível europeu. É só mesmo um protocolo elaborado.
Se vierem com vistos de estudante, das duas uma, pedem a Autorização de Residência CPLP, e dentro das residências disponíveis que têm é um mecanismo rápido. No entanto, depois retira-lhes uma série de privilégios que um título de residência lhes pode dar, mas não conseguem fazer marcação para ir tratar do título de residência, independentemente do visto que tenham. Está tudo muito indeciso, “indefinido” e atrasado.
A AIMA , o ano passado, abriu um concurso para trabalhar diretamente com o escritório de advogados, com vista a despachar os processos judiciais pendentes. Mais tarde, abriu outro para proceder à análise dos pedidos de residência para advogados e solicitadores se poderem inscrever.
Mas a realidade, é que depois com a emissão do cartão, “voltamos ao mesmo problema”. Porque os processos são despachados, e depois para a emissão do cartão enfrentam muitos meses de espera.
Estas medidas têm sido insuficientes para quem se quer legalizar. O Estado português pronunciou-se relativamente à CPLP a dizer que ia arranjar uma solução, “mas a realidade é que até hoje continuamos a aguardar uma solução que não existe.” Confirma a Advogada.
Quantos imigrantes da CPLP estarão ilegais?
Portugal acolhe todos os anos vários milhares de cidadãos da CPLP, mas não se sabe ao certo quantos ilegais estarão a viver no país, “talvez mais de 50 mil”, refere a advogada. Há muita gente em situação ilegal. “Os dados concretos que temos é que até à revogação do artigo 88/6, da lei dos estrangeiros, os processos que já estavam instaurados até à data, continuam a correr, até ao final do ano passado, estavam a dar despacho aos processos de 2021. “Estamos a falar que ainda estavam a decorrer em 2022.”
Depois, a pandemia também atrasou tudo. E aquelas pessoas que vieram para Portugal, que não conseguiram dar entrada até à revogação daquele artigo, referente aos processos em causa, “neste momento, vêm-se com uma mão à frente e outra atrás, porque não há soluções para tal,” reitera.
A legalização
O processo de legalização é um desafio, na linha da opinião jurídica da profissional “o visto tem um prazo de validade pronto”, quando “vi aquilo que o Estado português fez, que é o mais fácil de todos: lançou um decreto-lei a dizer que todos os vistos, os títulos de residência que entretanto caducaram neste período de tempo e que não conseguem fazer a renovação. Presumem-se prorrogados até dia 30 de junho de 2025.” Esta foi a alternativa mais simples, mas a realidade é que, na prática, não funciona assim. “Porque uma pessoa que queira viajar para outro país que não o seu, não consegue, porque temos um decreto-lei que diz que estão prorrogados até dia 30 de junho de 2025, uma tentativa de tentar minimizar toda esta situação”, mas não reconhecido lá fora.
A resolução
Todos estes problemas elencados já se prolongam no tempo. “Garantidamente há mais de um ano”. “Desde que sai, da AIMA em dezembro de 2023,” que não há marcações. Garante a Advogada Catarina Ferreira Marques.
Há a via da CPLP. Ainda que não seja dado o título de residência, é o organismo que está a dar respostas imediatas aos estrangeiros. Porque ficam com um documento como estão legais em território nacional e dá para renovação. Porque é tudo online, apresenta-se um QR CODE com um código e com os dados breves das pessoas a dizer que estão válidas até um ano, e depois dá para renovar mais um ano. E é um processo que se desenrola sempre do mesmo modo repetitivo, deixando vidas em constante “renovação”.
Mas parece ser a solução mais rápida e “eficaz”, mas como não há bela sem senão, muitos estrangeiros que vêm para cá estudar, depois, por razões de ordem económica, muitos deles não conseguem terminar os estudos e, portanto, nem sequer alterar, ou arranjar emprego “ porque não conseguem pedir a alteração do título para trabalho. Porque só se presume que consigam pedir alteração do estudo para o trabalho se tiverem estudos concluídos com sucesso.”
“Os meus clientes, maioritariamente vêm dos PALOP, eu nunca aconselhava pedir a via CPLP.” Muitos deles já tinham na altura, a “manifestação de interesse” feita, alguns deles até já com dois anos de espera. “Eu aconselhava-os sempre a esperar que saísse a decisão, porque já sabia que mais cedo ou mais tarde não ia dar em nada. Já conhecíamos, enquanto advogados, as condições da CPLP, mas creio que isto não foi passado para os estrangeiros.”
Os estrangeiros começaram a ver a CPLP como uma boia de salva-vidas em Portugal, porque muitos deles estavam há 2, 3 anos à espera, e nem sequer resposta de uma “manifestação de interesse” tinham, porque a “manifestação de interesse”, são os preliminares de acesso ao título de residência para trabalho. Às vezes estavam à espera quase três anos de uma de uma decisão. E mesmo nessa altura, “nunca aconselhei nenhum cliente meu que optasse por essa via.”
Neste momento, enquanto advogados, “temos em mãos a intimação judicial para proceder à marcação, quando passa o prazo de 90 dias sem que haja qualquer resposta, tanto para a marcação como depois para a decisão.”
Recomendações
“As coisas também não estão muito fáceis ao nível das embaixadas nos países de origem para que possam pedir uma marcação para o visto. Há muitas situações, nomeadamente nos PALOP, principalmente por causa das famílias numerosas, que têm às vezes título, não de reagrupamentos familiares, quando têm um pai ou uma mãe que já são portugueses e pretendem vir para cá, aciona-se o artigo 15, que é o de filhos de cidadãos comunitários, mas há sempre um senão: precisam de estar em Portugal.
Portanto aquilo que “nós (advogados) costumamos fazer por norma, é pedir um visto de férias, para virem para Portugal” e depois, quando estiverem cá, ou começam a estudar, se forem menores são obrigados a estar inscritos na escola. Ou então começam a estudar e depois mais tarde pede-se o título de residência para estudante.
Ou então, se já tiverem um pai português, ou com um título de residência, pode fazer o pedido através dos pais. Se não conseguirem o visto para trabalho, porque é muito complicado, através de Portugal, arranjar neste momento contratos de promessa de trabalho e dizer que se vão responsabilizar por esses trabalhadores. Até à data já mais de metade das empresas nem sequer fazem contratos a quem não esteja legal no país.
A outra via é através de um visto de férias, e depois, quando chegassem a Portugal, ou ingressavam nos estudos ou através dum familiar, neste caso o pai e mãe, que já tivessem cá um reagrupamento familiar ou solicitavam o cartão de residência por serem familiares de cidadão português.
Mas como não há marcações para nada, “temos de aguardar o prazo de 90 dias, que é o prazo que a administração tem para decidir sobre estas questões, e intentar a intimação para obrigar a AIMA a fazer o agendamento e entregar os documentos”. “E depois obrigá-los também a decidir num prazo razoável,” explica Catarina Ferreira Marques.
Os vistos são gratuitos?
Tem havido uns “zuns” sobre a compra e venda de vistos.
Questionámos a advogada se sabe alguma coisa sobre este assunto, e revelou-nos que não sabe, porque os vistos são pedidos na embaixada.
“O nosso trabalho enquanto advogados, é: se vier uma pessoa a solicitar um pedido de visto para alguém que esteja num outro país, nós tratamos da documentação toda, mas depois essa pessoa tem de enviar os documentos para o país de origem para irem à embaixada entregar.”
O artigo 15 que se refere aos “cidadãos comunitários”, tendo um pai, uma mãe portuguesa, não podem fazer o reagrupamento familiar, pedem sim, para ter um título de residência através dos pais. É um título de residência com mais validade. Neste momento tem o prazo de 5 anos e é renovado, ou não, por exemplo, se forem filhos até aos 21 anos conseguem ter esse título de residência, bem como se provarem que dependem financeiramente dos pais. Se forem mais velhos, então não conseguem pedir através dos pais.
