
As eleições foram ontem. Hoje ouço por todo lado: foi um terramoto. Mas Lisboa continua menina e moça… ou será que é desta que vira mulher !?
O que dizer? Começo por: o PS ganhou. Não as eleições, claro, mas ganhou uma oportunidade. A oportunidade de mostrar que, num tempo em que muitos desesperam, ainda é possível ver com clareza. A oportunidade de fortalecer o chamado Bloco Central, mas não para perpetuar o sistema, não, mas sim para o reformar, com coragem e sem ruído inútil. Espero que “o Senhor que se siga” seja capaz de o fazer.
Há momentos que exigem mais do que slogans. Exigem visão e serviço. O pós-eleições é sempre uma oportunidade, mas só a coragem pode transformar essa oportunidade em progresso. O reforçado Primeiro-Ministro, que dizer “novo” seria incorrecto, terá agora nas mãos a difícil missão de governar num terreno minado por desconfiança, frustração e extremismos. E nós (todos nós), teremos a responsabilidade de lhe dar espaço. Deixá-lo trabalhar! De lhe dar a oportunidade de provar que é possível fazer diferente, mesmo no centro do turbilhão.
Mas nenhum governo forte se faz sem uma oposição forte. E é tempo de lembrarmo-nos do que significa uma verdadeira oposição. Não é obstáculo. É perspetiva. É vigília. É alternativa. Uma oposição capaz de propor reformas estruturais , como aquelas que Rui Rio defendeu e que, já fora da política, continua a afirmar com uma lucidez rara. Reforma da justiça, da educação, da administração pública, do sistema eleitoral. Temas sérios. Estruturantes. Que não fazem manchetes sensacionalistas, mas fazem países melhores.
E por mais que se tente reprimir forças incómodas, quanto mais as abafamos, mais crescem nas sombras. Ignorar os sinais de cansaço social, desvalorizá-los ou ridicularizá-los só faz com que se tornem gritos ensurdecedores. Há culpa, sim. Há responsabilidade na esquerda que não soube ouvir e também haverá, no futuro, na direita que não quiser aprender. Aprendamos todos !
A imigração, a aculturação, a perceção de segurança, o acesso à habitação, os serviços públicos são todos temas difíceis. São realidades que exigem coragem para serem discutidas de forma adulta. Sem infantilizações, sem medo da verdade. Sem procurar lobos maus em cada esquina. Porque os extremismos não nascem do nada, não aparecem com passes de magia. Sabemos bem como nascem que se criam no silêncio e na arrogância dos que deviam ter escutado antes e agido. Por isso falo tanto de quebrar as correntes da apatia que ela sim mata, como um rio em que não há oxigénio na água por algas “daninhas”.
Para quem se esqueceu, Bolsonaro, por exemplo, também prometeu tudo. E nada fez. A Argentina já paga o preço da ilusão do “salvador “ e nem falaremos na América porque ver líderes receberem aviões de presente, grita : olha olha , como o ditador se revela. Porque, como dizia o grande Chaplin no seu eterno discurso, “os ditadores não servem o povo, servem-se a si próprios”. Sejam de esquerda ou de direita, a máscara é diferente, mas o ego é o mesmo. A fome voraz de se alimentarem dos outros também.
O que precisamos, mais do que nunca, são cidadãos ativos. Com coragem. Com pensamento crítico. Com firmeza, sim, mas também com lucidez para não cair no engodo de falsas soluções fáceis. Porque uma casa onde se varre o pó para baixo do tapete continua suja. E se ninguém a limpar, mais tarde ou mais cedo, o cheiro torna-se insuportável.
Eu não tenho partido (ainda , porque o futuro a Deus pertence, bem o sabemos). Mas tenho voz. E prometo usá-la. Para transformar, para provocar, para construir. Mesmo quando isso significar ser impopular. Como uma mãe que, por amor, diz o que é preciso, mesmo que doa. Porque amar um país é querer o melhor para ele, mesmo que o melhor não seja fácil.
E acima de tudo, o que nunca aceitarei é que se comprometa a democracia. Que se ameace a liberdade. Que se silencie a diversidade política. Que se esmague o pensamento. Portugal merece mais. Merece ser um país onde é bom viver. Onde é seguro viver. Onde há espaço para pensar, discordar, contribuir. E onde cada cidadão vale por inteiro, e não apenas pelo voto.
E como sempre :que este texto vos inspire ou vos provoque. Não procure concordância, mas romper as correntes da apatia.
Por Marisa Monteiro Borsboom
