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Segunda-feira - 14 Outubro 2024

Luís Onofre com mais uma nova coleção, “o online é o futuro”

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O Jornal Comunidades esteve à conversa com Luís Onofre. Numa entrevista intimista, o designer de calçado recordou o seu percurso e perspetivou o futuro do comércio de luxo. Afinal, qual é a mulher que não gosta de ter uns Luís Onofre no seu armário?

“A história da minha empresa remonta a 1938, logo após o meu avô regressar do Brasil. Estabeleceu-se na região de Aveiro, em Oliveira de Azemeís, e passou a produzir, desde o primeiro dia, calçado de grande qualidade.

Um ano depois, infelizmente, faleceu. Coube à minha avó a responsabilidade de assumir os destinos da empresa. Foi uma grande mulher, num tempo muito difícil, num mundo dominado pelos homens. Aliás, hoje, na terceira geração, o nome da empresa continua a ser uma homenagem a essa grande mulher: Conceição Rosa Pereira Lda.

Já com o meu pai, a empresa cresceu, ganhou dimensão e começou a dar os primeiros passos nos mercados internacionais, nomeadamente com a designação Calçado Onofre. Trabalhávamos nessa altura para marcas francesas como a Pienzzo, Cacharel, Daniel Ester, entre outras.

Numa versão muito simplificada, esta foi a nossa história da empresa nos primeiros cinquenta anos.

Mais tarde, já na minha liderança, acabamos por criar uma segunda empresa, a Luís Onofre Internacional, que trabalha fundamentalmente para marcas de grande prestígio. UM passo importante passou pela criação da marca própria, Luís Onofre”.

O gosto pelo calçado

“Confesso que, num primeiro momento, não senti especial impulso para trabalhar na indústria de calçado. É um setor muito exigente, com muita competição, uma montanha-russa permanente. O meu pai acabou por me falar ao coração e convencer. Ainda bem que o fez”.

Estudei na Escola das Belas Artes e, mais tarde, concluí o curso de design no Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado, hoje Academia de Design, em S. João da Madeira. Assim que consegui executar na plenitude o meu primeiro sapato… percebi que foi amor à primeira vista. A partir desse momento, soube que era isto que eu queria fazer”.

O primeiro sapato 3D

“O primeiro sapato com o meu próprio cunho foi apresentado num concurso de design em Itália, organizado pela ARS Suttoria, uma revista de calçado e, em simultâneo, uma escola muito prestigiada. Entre propostas de todo o mundo, acabei por vencer. Foi naturalmente um incentivo complementar. Hoje, não ligo muito a prémios, mas nessa altura deu-me um especial alento para continuar.

“Já em 1996, lancei pela primeira vez a marca Luís Onofre. Foi um grande desafio. Apesar de ter pouca experiência, fiz questão que a primeira apresentação ocorresse no exterior, precisamente em Madrid. Logo depois, estávamos a fazer as principais feiras internacionais.

Hoje, a minha estratégia é diferente. Privilegiamos a abordagem ao segmento de luxo e, por esse motivo, optamos por investir em ações em Showrooms, mas também no online. Com esse espírito, adequamos a apresentação das coleções, desenvolvemos novos conteúdos, mesmo na esfera virtual. É todo um mundo novo que veio revolucionar os departamentos comerciais das empresas”.

A história de Michel Obama

“A história da minha marca foi construída por muitos momentos marcantes. Um dele foi o privilégio da (agora) Rainha Letícia de Espanha ter usados sapatos Luís Onofre nas suas quatro primeiras apresentações oficiais.

Outra história interessante relaciona-se com Michele Obama. Fui contactado por uma alta personalidade do governo português com o objetivo de oferecer uns sapatos portugueses à Primeira Dama dos Estados Unidos. Acabamos por proceder a essa oferta por altura de uma visita de Barack Obama a Portugal, por ocasião de uma conferência da NATO.

Mais tarde, recebi uma carta muito simpática de Michele Obama a agradecer o gesto. Ainda hoje guardo religiosamente essa carta, que me deixou muito honrado, naturalmente.

Nessa altura em particular, havia algum preconceito relativamente às marcas portuguesas. Precisávamos de ter sucesso lá fora para singrarmos no nosso próprio país.

“Acabei por ser feliz. Tive essa oportunidade quando estavam a surgir várias lojas multimarca, tanto em Portugal como Espanha.”

Hoje, infelizmente, está a ocorrer um fenómeno contrário, com o encerramento de vários postos de venda. Na Alemanha, por exemplo, fecharam, no espaço de um ano, mais de 1500 lojas, e em Espanha mais de 500. Atualmente, grande parte do negócio é feito online ou na própria loja de cada designer. Os grandes “Department Stores” são igualmente importantes, mas exigem recursos financeiros muito elevados.

O comércio, de um modo geral, está destruturado. É muito difícil projetar o futuro. Consciente dessas dificuldades, a minha aposta recairá no reforço do online. Vamos lançar a nossa nova plataforma no dia 15 de setembro, com a apresentação da nova coleção, com um site muito mais rápido, muito mais intuitivo, com uma série de alterações muito interessantes que vão fazer a diferença.  Este investimento irá permitir-nos entrar no mercado Norte Americano, que tem sido o cliente número um da loja em Lisboa, e online também”. 

Encerramento de muitas lojas de calçado a nível Internacional

“Fecharam centenas de lojas de calçado e vestuário desde o início da pandemia. Outras tiveram que procurar marcas de menor custo nos mercados asiáticos para poderem manter as portas abertas. Os apoios são escassos e esquecem, quase sempre, este tipo de lojas, porque os novos designers têm poucos recursos e não passam sem clientes.

Temos de olhar para os novos designers, para podermos apoiar esta nova vaga de criadores e criativos que começam a emergir”.

Quantas lojas, e onde vem a inspiração?

“Os sapatos Luís Onofre são comercializados, no essencial, em lojas multimarca, quer em Portugal, quer no exterior.

A loja Luís Onofre de Lisboa está consolidada.  Já no Porto, estamos em processo de mudança e espero para o ano ter uma presença no El Corte Inglés. A loja online tem vindo a crescer de forma sustentada.  Será uma aposta reforçada de futuro.

A inspiração depende de muitos fatores, desde o estado de espírito, uma viagem que fiz, um livro que apreciei ou mesmo um filme que me encantou… Mas também depende do tempo que dedico a cada coleção.

Aliás, o processo criativo é muito complexo, todos os pormenores devem ser tidos em consideração.  Hoje em dia, por exemplo, as dificuldades de acesso às matérias-primas têm de ser mitigadas. Tempos de procurar constantemente novas soluções criativas”.

Planos para o futuro

“No contexto atual, fazer futurologia não é propriamente um exercício que aprecie particularmente.

A pandemia, em especial, veio alterar toda a fileira da moda. Pôs em causa muitos negócios. Sucedeu-se uma Guerra na Europa. Vivemos em tensão permanente. Nos dias de hoje ser empresário é um grande desafio. 

Eu não serei um designer tradicional, saio fora da linha dos designers nacionais, porque detenho uma fábrica e acabo por ter dezenas de pessoas a trabalhar comigo. É uma grande responsabilidade.

Tenho de ser pragmático, tenho muita gente que depende de mim. Daí que considere o trabalho em “private label” muito importante, pois permite-me rentabilizar o negócio.

O ano passado foi um ano fantástico para a indústria de calçado, não obstante os constrangimentos de acesso às matérias-primas. Temos igualmente dificuldades de contratar mais profissionais. São dificuldades com que lidamos regularmente. Temos vários obstáculos que temos de ultrapassar para continuar a levar o negócio para a frente”.

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